quarta-feira, 29 de abril de 2015

Nada se perde e então se transforma

O crazy pode apresentar um tema. O deste é o casario naive (na parte superior). Mas o que este crazy tem de singular é que todo o material nele utilizado - lenços, rendas, fitas e tecidos - é bastante antigo, extraído de roupas velhas, colchas, toalhas de renda e demais guardados, e todos trazem o encardido natural do tempo nas gavetas. Flores e folhas nasceram por ali, como num jardim onde não se capina, apenas joga-se água e bate sol. Compor este trabalho me ensinou a procurar beleza em trapos, a não desprezar nem o mais insignificante pedaço de fita. 


Marô riscou algumas samambaias aqui e ali, além de fazer o céu com a noite e o dia. Sobre esse desenho usei pontos em folha, areia, cheio, nó francês, alinhavo, haste, maria-preguiçosa, matiz, atrás, sombra, bondade-de-deus, caseado, chavão e corrente.

E, ao final, este crazy se transformou num quadro, hoje na parede do meu quarto de bordar.


terça-feira, 28 de abril de 2015

Com licença, Klimt



A técnica do bordado oferece inúmeras maneiras de expressão. Uma delas é trabalhar um tecido estampado, rebordando partes do desenho, ou, numa espécie de homenagem, cobrir aqui e ali uma pintura. Depois de muito procurar, finalmente encontrei uma copiadora que fizesse em linho belga, mais encorpado, uma impressão fiel da belíssima Lady With Fan, pintada por Gustav Klimt entre 1917 e 1918. Aí está ela:




A sugestão da imagem veio da amiga Betinha, que recriou em madeira O Beijo, também de Klimt, trabalho que hoje enfeita uma bela residência na Irlanda.

O grande desafio da minha Dama Com Leque era manter bonita essa enigmática mulher de pescoço interminável e olhar mortiço. Em volta dela pássaros e flores flutuam sobre fundo amarelo. Nesse quadro, tudo é inspirado; em que momento da vida devia estar Klimt ao criar essa maravilha! E lá fui eu, munida de ousadia e linhas, brincar sobre a arte. 


Usei todos os pontos que conheço, mas era pouco: desmanchei várias vezes, numa forma de respeito ao trabalho original. Mas, como costuma acontecer, de repente o trabalho estava pronto. E não é que a minha Dama ficou um pouco diferente? Creio não ter conseguido captar a distância do seu olhar, mas isso é culpa das minhas limitações artísticas.

Espero que você goste. 

domingo, 22 de junho de 2014

Jardim zen


Dar um bordado a alguém é um presente que ofereço a mim mesma. Ao procurar o risco, geralmente já tenho em mente o jeito da amiga, seus gostos, seu temperamento. Aí começa um outro aprendizado: fazer com que o trabalho reflita uma característica especial da amiga que será presenteada. 

Joana parece um lago profundo. Fala pouco e em voz baixa, mas percebe tudo em volta. E procura colocar em tudo o que vê um pouco do budismo que cultiva. Por isso escolhi fazer para ela uma almofada que representasse um lugar - físico e espiritual. Joana sente-se bem a sós, o que é raro, então pensei num banco de jardim em meio ao silêncio. Mais uma vez encontrei na internet o risco de um jardim visto do alto. Marô adaptou e semeou algumas flores. De onde Joana vier, encontrará um local que estimula a paz de espírito. É o que desejo.


Para saborear, para acalmar, para ungir, para refrescar. 

Uma paixão bem crazy

crazy é um tipo de bordado aparentemente desordenado, por isso tem esse nome, que significa "louco". Realmente não há um risco formal, mas sim um tema, que, como numa música, pode ser trabalhado. Quando vi pela primeira vez um crazy quase pronto, da colega Suzana, me apaixonei completamente e parti para fazer o meu. Escolhi, como ela, cores pastéis. Como a paixão era grande demais, resolvi bordar um enorme, que mede 70cm X 1,40cm. Bordei e rebordei durante 9 meses, e, como numa gravidez, muita gente acompanhou e comemorou comigo o resultado final.


Nesta foto estão comigo: Patrícia, Leandra, Ruth, Chalita, Martinha, Max e Jussara. Todas elas acompanharam, opinaram e gostaram do resultado. Meu trabalho ganhou ainda uma bela moldura concebida e feita pela Lígia, da Rota do Quilt. Ele enfeita a parede sobre a mesa em minha casa. Abaixo, alguns detalhes:









Tudo aqui é feito de rendas de todo tipo, antigas e novas, mas somente de algodão. Com meu trabalho fui a vários lugares, inclusive aeroportos e hospitais. E aeroportos são lugares de esperar, tudo demora horas. Pude perceber, então, como o fato de ver alguém bordando mexe com as pessoas. Aos poucos elas se aproximam e começam a falar. Sempre há uma tia, uma avó, a mãe, que também bordava. E as lembranças são sempre doces, vindas da infância. Costumo ouvir relatos que aos poucos vão se transformando em confidências, talvez porque, ao bordar, mantenho a cabeça baixa e não há troca de olhares. Não é o máximo ter o poder de colocar alguém para falar só de ficar quietinha e calada, apenas manuseando fios coloridos?

quinta-feira, 29 de maio de 2014

Araras e flores

Os tecidos estampados são uma ótima opção para bordar. O desenho dá a direção, mas é possível criar sobre a estampa. E o mais interessante de tudo é poder escolher a hora de parar. Posso cobrir tudo ou apenas partes do desenho. O trabalho das araras está guardado, ainda não virou coisa alguma, mas provavelmente será uma almofada. 


Este tecido é italiano e já vem com um desenho lindo. O bordado foi feito em linha grossa, com ponto matiz e cobrindo somente parte da estampa.




A mesma técnica de cobrir partes da estampa foi usada aqui, nestas flores. A cor roxa é minha favorita, nada enfeita mais do que tons fortes de roxo misturados com suaves lilazes. Basicamente usei aqui o ponto matiz, que tem um efeito maravilhoso e que acho muito, muito difícil. Como nunca desenhei nada nesta vida, sinto que para bordar um bom matiz é preciso ser um pouco artista. Mas eu amo aprender, e assim cada trabalho é uma tentativa e um passo na direção do melhor.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Corrente

O ato de bordar é uma senha: abre portas em várias direções. O olhar sobre a natureza muda. Uma vez, esperando alguém numa esquina, comecei a observar uma folha. Vi ranhuras em sentidos diferentes, linhas finas, grossas e dois ou três tons de verde. Tudo isso numa folha com menos de 10 centímetros. Neste dia, graças ao atraso de uma amiga para um compromisso de almoço, eu senti que minha vida havia ficado mais rica. E este círculo virtuoso não cessa.

Outra mudança foi na área dos presentes - para lá e para cá. Ana, minha enteada, presenteou-me com esta revista, uma publicação do Britsh Museum de Londres.



Os bordados ali ilustrados são rústicos, cheios (quase não se vê o tecido) e bastante coloridos. Aprendi então que pequenos "defeitos" são, na verdade, estilo, como uma assinatura. É assim também com os tapetes persas, nos quais as pequenas diferenças entre os pontos são uma marca registrada do artesão, além de demonstrar que o trabalho é feito a mão.



Olhei estes detalhes demoradamente. A partir desta observação criei, em cores e pontos, meu primeiro trabalho. Desmanchei um macacão de linho cáqui que não servia mais, escolhi cores neutras e fiz uma moldura dentro de uma moldura dentro de uma moldura...



É claro que este trabalho, feito de roupa velha, só poderia ir morar na Irlanda, na casa de minha amiga Betinha, quem a conhece sabe do que estou falando. Ali chegando, ganhou um lugar especial, no Sun Room recém construído. Olha que orgulho! Um trabalho delicioso de fazer e que despertou lindas palavras de agradecimento: "...sorrindo com os olhos marejados, eu nem pousei a almofada em lugar nenhum, antes de chegar com ela no ponto que já era dela, sem eu precisar pestanejar pra saber, no lugar mais bonito na nossa casa... O objeto em si, o tamanho, o tecido, AS COOOREEEES!!!!, e, claro, o trabalho de arte coroando e literalmente emoldurando tudo!"



No fundo cáqui até as cores neutras brilham. Aqui usei vários pontos: ilhós, chavão, maria-preguiçosa, nó francês, folha, aresta, caseado, cheio, corrente, haste e alinhavo.



terça-feira, 6 de maio de 2014

Banksy

A imagem que ilustra meu perfil é um trabalho do artista inglês Banksy. Fiz duas almofadas para minha amiga Lelena, que vive em Londres.






Encontrei as imagens na internet e Marô fez o risco. O bordado foi todo feito em pontos haste. Neste trabalho percebi como é difícil bordar em preto, mas com persistência é possível chegar a um bom resultado.